quarta-feira, janeiro 16, 2008

Operação STOP

Há umas semanas, fui apanhado na minha primeira operação STOP. No meu entusiasmo de incipiente condutor, tinha, pouco antes de ser parado, conduzido a cerca de 120 km/h, numa zona com limite de 100 km/h. Pensei para comigo que aquelas figuras do livros de fadas - os radares - afinal existiriam mesmo, e agora eu tinha que explicar aos "leprichauns" da GNR (que afinal também existem, mas só mesmo na estrada) porque é que não estava a respeitar esse belo livro de ficção, ao estilo de Carrol, Tolkien, e La Fontaine, que dá pelo nome enigmático de "Código da Estrada". "Então o senhor não parou ali quando o relojoeiro maluco estava a passar? Veja lá se quer ir passar a noite ao País das Maravilhas, amigo. Agente Dorothy, venha cá dizer a este senhor que já não está no Kansas, faz favor. E, já agora, peça à Sininho para trazer o teste do balão."

Agito a cabeça de repente - a situação é bem real. "Boa noite sr. condutor. Os seus documentos fachavôr." pediu-me o GNR de colete amarelo, enquanto olhava sempre para trás, buscando não sei exactamente o quê. Estaria a rir-se para os colegas? ("Este tá no papo..."). Mas onde é que estão os documentos? Estou sempre a ser tramado pelos pormenores. ("Olha, Amílcar, este aqui nem os documentos tem!"). Calma - estão aqui, no porta luvas. Um porta-cartões de plástico onde eles estão, mal dobrados, volumosos. "Ora aqui tem...". "Eu pedi-lhe os seus documentos", e volta a dar-me tudo aquilo. É agora - estou lixado com F grande (tantos anos de educação esmerada...). Mas não - podia ser que ele estivesse só a ser [nome mitológico associado ao macho caprino]. E estava. Ah, então tenho que os tirar do plástico, descascar a maçãzita. Tome lá homem. (Nota: como é bonito revisitar a situação como se não estivesse ali acagaçado e sabiamente obediente).

Lá vê um registo, outra licença, passa pela recomendação, vê a data da procuração, analisa o alvará e vira a notificação ao contrário. E eu observava o silêncio na expectativa da contra-ordenação. Cassação? "O seu seguro acaba a [dentro de dois dias]". ("Toma Amílcar! Continuo à frente. [Faz dança de vitória abichanada meneando as ancas, com os braços juntos]. Quem é o maior? Quem é o maior?"). "Saia do veículo, fachavôr. Coletes e triângulo". Conectores de discurso - zero. Lá mostro essas preciosidades (tanto plástico no meu carro, caramba). "Pode seguir". A sério? Assim sem mais? Muito agradecido. E pá - lindo. Deixa-me cá fazer tudo segundo o canon. Primeiro o cinto, desengatar, ignição, engatar, destravar. Tá tudo não é? Adeuzinho! "Ligue as luzes". F*****! "Ah, [riso apologético]. Obrigado". Mas, tudo bem, agora estávamos entre amigos. Até à próxima honorável defensor da Lei. Desculpe lá aquilo da dança. Cumprimentos ao Amílcar.

E pronto. Lá me fui embora, pensando como deve ser mau o nível médio do condutor português. Ora ali estava um condutor ainda tão inábil, tão trapalhão, que nem sabia o que eram "documentos", que por acaso tinha a inspecção feita, que andou a acelerar (a 12o, que eu quando exagero é até ao limite) antes de ser parado, que nem sequer o banco tem bem ajustado, que não liga as luzes - e passa assim pelo crivo?! Parece que estava a ler a primeira página do jornal (publicado em inglês, para ser internacional) The Life of Pedro Times: "Little Bastard Gets Away With It (Again!)".

Foi assim a primeira operação STOP. Validado como cidadão, suponho - nada demais. É fazer sinal e entrar na faixa, que a estrada - e a vida - continuam.