sábado, março 21, 2009

O Esforço

E pronto - amanhã é o dia da Mini.

Mini Anden



Vai custar - mas valer imensamente o esforço.

Boa Acção do Dia 16

"Português para estrangeiros", em "Um Bife Mal Passado" - crónicas de Alexander Ellis, embaixador britânico em Portugal.

Matam-nos (Aos Adeptos) Com Capas Dessas

Mas que raio de capa é esta, hum?

Mas tu queres ver? Ui... Que...

Não vão por aí, amigos jornalistas. A gente quando quer comprar a "Marie Claire" ou a "Facial Creme Monthly" - compra. Não - não vão por aí.

Low Expectations

Vejam bem onde o "downsizing"* já chegou.

Por outro lado... pode ser o apogeu dos indivíduos com barriga! Hei - estou aqui!

Afinal, como diziam os 'yuppies': "em chinês o caracter de crise e oportunidade é o mesmo!". Embora... as suas dicas - de vida e outras - tenham perdido bastante valor.

*Talvez seja melhor a expressão "cutting back". Afinal, o 'tamanho', propriamente dito, não é, na verdade, inferior (Sem gozo - daqui só virá solidariedade. Talvez daqui a uns anos esteja ali eu, e minha barriga. Estão a rir-se, não é? Pois constatem os factos, meus amigos...).

Chancela

Hum... E se um dos Gato Fedorento, quando chegasse a hora de escolher o novo nome para a nova série, naquela altura, meramente olhasse para um livro esquecido, ou se recordasse de ver o nome algures?

Editora Lopes da Silva? Pois é, parece que existiu mesmo uma.

sexta-feira, março 20, 2009

De Novo

Parece-me ouvir de novo
Risos, tocar de talhares,
Histórias,
Vozes de mulheres,
Paz.

Que estranho mundo -
Este -
E traz com a dor sinais de esperança,
Dúvidas, dúvidas,
De bonança
E um desejo a perfeição.

Traz um sonho de criança,
Tímido, por entre o feroz Verão.

Pedro Oliveira

quinta-feira, março 19, 2009

Novas Regras Desenhadas

O homem novo apitou,
E apitou novamente -
"Olha pra esta merda!",
Aos carros, em sua frente.

O homem novo rugiu
"Tou farto, não pode ser!",
E sua mulher saiu
Do carro, para perceber
Toda aquela confusão.

Reclamava também ela
"- Realmente!",
Falou com gente daquela,
Que não pensa em quem sente
Um espaço ao fim do dia,
Ao fim de um dia assim quente;
"É que é sempre esta avaria!" -
Diz do carro, impaciente
O seu marido.

São...
Carros mal-estacionados,
Novas regras desenhadas,
Para pessoas, para estradas
Neste chegar de uma vida -
E ter onde estacionar -
No mesmo ponto de partida.

Pedro Oliveira

Momentos 16

Daquela toca às vez saíam barulhos estranhos. Gritos, desesperos, desabafos. Mas a família Lapin, coelhos que se haviam instalado naquela fresca e escondida zona do bosque havia algum tempo, tratava com serenidade todos os vizinhos. Dizia-se que os Lapin viviam bem - embora aquele não fosse bairro de mamíferos abastados. Era uma parte da bosque sem grande agitação - com o "ecossistema em equilíbrio", como dizia o patriarca Júlio Lapin, rindo-se.

Mesmo a origem aparentemente estrangeira do nome criava desconfiança. A isso se juntavam os gritos, as ofensas que saíam da toca, e que eles ouviam. Ruído que não se coadunava com o porte distante e polido dos Lapin no trato dos vizinhos... Havia um mundo dentro da toca, que apenas transparecia para fora, e tornava a vida de fora como que um acto de teatro.

Felício Lebre não percebia aqueles lagomorfos. Via-os a ter que sair da toca para apanhar as suas ervas, as suas raízes, e via-os bem alimentados. Nem sempre ele se podia gabar do mesmo. "Mas o que farão estes coelhos...?". A distância a que o remetiam não lhe permitia investigar mais sobre o assunto. Mas várias vezes concebia com alguma raiva aquela vida tranquila, de pêlo luzidio, enquanto que ele tinha que escapar a tantos predadores para manter o seu covil. Por vezes detestava aqueles coelhos, tão insistentes no trato frio, empurrando a sua curiosidade.

Um dia, porém, houve um furão que chegou àquela parte distante da floresta. Criou-se o pânico. Prevenidos, porém, os Lapin defenderam-se como puderam, os Lebre também. Depois de muito esforço, no final do susto, o furão já distante, Júlio Lapin não evitou olhar olhos nos olhos Felício Lebre. "- Isto é inadmissível!". Com alguma surpresa, Felício retorquiu: "Pois é, pois é... Esperemos não se repita". Júlio Lapin estendeu-lhe então a mão, e cumprimentou-o. Mais sereno perante tais situações-limite, Felício estava composto, e aquele cumprimento despertou em si um pequeno sorriso. Viu nele a ponte que necessitava para o futuro. "- Afinal sempre teve que dar a pata a torcer", diria depois a Juta, lebre sua esposa.

Daí em diante começaria a fazer conversa com os Lapin sempre que se encontravam fora da toca, retorcendo o seu teatro de cortesia, face às discussões pouco edificantes que lhes conhecia. "- Pois é...", disse numa tarde ao Vivi Texugo, dono de uma taberna do outro lado do bosque, "verás Vivi - eles ainda vão ter que vir aqui comer erva à minha pata. Vais ver! Eu sei do que eles são feitos...". Ria-se então, acompanhado por Vivi, amigo de longa data, à difusa luz, reflectida pela sua plumagem coçada, amarela. "- Bendito furão aquele, Vivi. Bendito furão!".

Sentire

Ele falava em alto tom propositadamente. Com os amigos, discorria sobre as 'damas' que conhecia em jogos na net. Qual era o nome daquela? "Só quero afogar o ganso. Falei com ela, disse que já tava farto de ir para os copos com os gajos. E ela disse que tinha vodka".

De repente trocava, já não falava de 'damas', 'cena', 'chaval'. Falava brasileiro? Imitava o sotaque. Porquê? Ah. Mas 'o gajo', 'a dama', 'ya', 'ya', 'ya', 'tás a ver?' voltou, voltaram.

E à distância o mitrês trocava com um sotaque brasileiro. Propositadamente a fazer-se sentir. Aliás, em italiano, 'ouvir' é 'sentire'. E há conversas, tons, rumores, dúvidas que se querem fazer 'sentir' em redor - às outras pessoas.

Mas depois, só, houve ainda um galão a beber. E apontou ao empregado como um colega se esquecia de um pormenor no serviço da bebida.

Talvez tantas vezes, ao nosso jeito, usemos o nosso qualquer 'mitrês' ou 'pseudo-brasileiro' para nos fazermos ouvir. Não - ninguém é perfeito. Talvez só nos distingamos se, realmente, ainda damos atenção a esse pormenor, a essa pequenice de que gostamos. Somos portugueses respeitadores enquanto gostarmos desse pormenor. É o nosso modo de melhor expressão - involuntária, silenciosa - pelo rumor que quisermos criar, com que quisermos dar a entender aos outros - aquilo que somos, aquilo que podemos ser.

terça-feira, março 17, 2009

Débito da Compaixão

A senhora cega pede esmola
E eu já não sei
Por onde ficou a esmola,
Quanta piedade gastei.

Além de mim alguém dá
Uma moeda sua,
Num gesto, detém-se a vida
E do secreto, vago festim
Se jejua.

Ah, o som da moeda
Que queda
No copo translúcido -
Quase se tocam as mãos -
E a senhora passa a dúvida
Pelos jovens fitos
Numa distracção.

Ah, quantas moedas nos roubam
E quantas nos roubamos,
Quando as não damos,
Àqueles que julgamos
Dever compaixão.

Afinal, esta vida -
De que se padece -
Tem a lição esquecida:
Moeda oferecida
Em nada empobrece.

Pedro Oliveira

Pode Ser Chato, Mas Pior é Não Ter Prefixos

Uma coisa que me apoquenta especialmente são as 'chain letters'. No entanto, as que apelam a maldições, promessas de felicidade, cheias de testes, historietas, e moralidades 'feel good' não me incomodam minimamente. Ignoro-as com gáudio.

Mas... deparo-me sempre com as 'chain letters' de pedido de ajuda, pessoas supostamente em desespero, para encontrar alguém perdido, ou com problemas médicos. Aí, muito a custo, tenho que abrir uma excepção. Detesto ter que incomodar pessoas que conheço, melhor ou pior, com tal missiva, mas... no caso de tal ser efectivamente verdade, não tenho, nem os recipientes, o direito de ignorar um genuíno pedido de socorro. Ninguém tem.

Certamente, nem tudo será fidedigno. Mas... outros fins menos nobres escondidos a uma primeira vista, quem somos nós para ignorar o que quer que seja? Eu acabo por não gostar de receber estas cartas - porque sinto o dever de incomodar outras pessoas enviando-a também. Às que leiam este blog, ficam as minhas desculpas.

Peço somente que concebam como é ser um familiar assim em desespero. Todos temos, como humanos, de ser feitos de um mínimo de empatia, de compaixão. E todos temos que esperar, também, nunca nas nossas vidas ficarmos sem os prefixos "em-" e "com-" - nunca ficarmos a sós com a dor, e com a ânsia.

segunda-feira, março 16, 2009

Small World

Diz que o mundo do futebol - o mundo em geral, realmente - é demasiado pequeno para dois portugueses terem sucesso ao mesmo tempo. Hei - a última palavra d' "Os Lusíadas" é inveja. Não por acaso, suponho. Não por acaso.

domingo, março 15, 2009

O Meu Verdadeiro Clube

Ainda a propósito de sportinguismos e benfiquismos, aqui há uns dias fui a um desses restaurantes de rodízio. Pergunta-me o senhor, brasileiro, quando eu peço uma caipirinha, se a quero normal ou "à Benfica". E explica, rindo-se: mais fraca, com sorriso malandro.

Ora eu, como sportinguista (ui... depois de tanta outra coisa mais importante) devia-me ter rido. Mas quer dizer, convém ter um pouco de pudor. Não teria grande sentido, depois do resultado de Munique.

O mais curioso, porém, é que eu não gostei da caipirinha "à homem", mas adorei a mais fraca e doce "à Benfica". E pronto, fico assim: sportinguista quando vou ao estádio, benfiquista para a caipirinha, e talvez portista quanto à cor. Não é mau, suponho. Tudo somado, dá português.

O Boi Pelo Nome, Clubismos e Rui Costa

Não, não, eu não me esqueci. Sem dúvida: uma derrota por 7-1 em Munique depois dos 5-0 em Alvalade 'bota' "milha" em humilhação: é muito extensa, de facto. Não, não, dizem bem - toda a razão.

Pessoalmente, estava à espera que o Sporting fosse cilindrado, mas nunca por tanto número. Agora, a 'million-dollar-question': o que é que isso me afecta? Zero. Se calhar alguns de vocês até estavam à espera dessa resposta.

Honestamente, pelos dias de hoje, os resultados do Sporting não me afectam minimamente, excepção feita quando vou ao estádio. Acho que é mesmo um luxo, hoje em dia, sofrer com o futebol. Eu não o tenho.

De qualquer forma, o meu sportinguismo, como de costume, vem sempre à tona quando me provocam a propósito do resultado, e, sendo que a maior parte são benfiquistas, eis a minha singela resposta: Riam-se à vontade. Digam o que quiserem. E até têm razão. Mas vocês sabem tão bem quanto eu que a decadência do Benfica é muito mais preocupante que a decadência do Sporting. Tenho ou não tenho razão?

A verdade é esta: se amanhã houver um presidente do Sporting com "garra" e heterodoxia, que disser que o Sporting, por causa desta crise económica, tem que fazer uma transição com somente júniores e meia dúzia dos jogadores actuais, eu garanto-vos que os sportinguistas estarão lá para os apoiar. E eu até vos garanto que uma tal equipa iria surpeender toda a gente pela positiva.

Não, a decadência no Sporting não me preocupa. Primeiro porque as oscilações no Sporting de Paulo Bento são desde sempre a única constante: nunca se sabe o que vem aí no próximo jogo. Segundo porque o Sporting está cheio de velhada, padece de excesso de verterania, e precisa de se refrescar com urgência. Tradicionalmente, porém, é um clube que faz isso com relativa facilidade. Até é bom o Sporting não ter dinheiro - para se ver obrigado a aproveitar até ao tutano a prata da casa - coisa que o seu estatuto maniento-burguês dos últimos tempos raramente concretiza.

Já não é assim com o Benfica. Quando há problemas no Benfica eles são muito mais estruturais. E isso significa que vão ter que rolar cabeças e ralharem comadres. Bem alto. E a maior parte dos benfiquistas tem enorme dificuldade em conciliar a simpatia por Vieira e Rui Costa com os resultados actuais. É como ter algo mal, mas não poder assacar as culpas a quem normalmente as arcaria.

Eu confesso: simpatizo bastante com Rui Costa, do ponto de vista pessoal. Foi um grande jogador, mas falo exclusivamente de personalidade. Explico melhor: no outro dia via uma foto de Figo com uns colegas de juventude. Crianças, apenas. Eu não quero elaborar demasiado sobre o tema, mas duvido seriamente que Figo tenha mantido o contacto com muitos desses primeiros amigos.

No pólo oposto, recordo-me de uma entrevista de Rui Costa em que ele falava de um colega das camadas jovens que seria tão bom ou melhor que ele naquele então, mas que não logrou dar o salto. Ora, na construcção do sucesso existem múltiplas variáveis. A sorte é uma delas.

Às vezes os melhores são atraiçoados por um pormenor. E já se sabe como é a História: ninguém fala dos segundos. Ninguém? Às vezes fala, como Rui Costa, que se lembrou desse outro rapaz, que não 'resultou', que ficou por qualquer razão, com quem até terá aprendido truques, perguntado como é que ele fazia aquilo, aquela finta, guardado ensinamentos para a vida. E evocou-o, depois de ter sucesso. Raríssimos são os que, em todas as áreas desta vida, o fazem. E eu tenho uma razão profunda - que o futuro desvelará - para escrever essa frase.

Eu não condeno os benfiquistas: se eu fosse benfiquista, eu também seria incapaz de culpar Rui Costa. Mas, como eles bem sabem, isso é estar entre a espada das más exibições e resultados e a parede do respeito a quem o merece.

Solução? Próxima época, naturalmente. A mesma de sempre - para os dois clubes.

Momentos 15

O sr. Cordeiro era um ovino singelo, de quem se dizia com justiça, e graça miúda: 'não faz mal a ninguém!'. Gostava de acordar cedo pela manhã, mastigar um punhado de erva 'nem demasiado verde, nem demasiado seca', ler placidamente o 'Correio da Lã'. Nem sempre dormia bem, e tinha que estar atento à sua saúde, por via das dúvidas.

O seu trabalho era simples, sem complicações. Trabalhava num notário perto de sua casa. Era pontual. Dizia mesmo a brincar que as outras ovelhas poderiam acertar os relógios do escritório pela sua entrada, mas nenhum dos seus colegas percebia bem quem fora o 'Manuel Cante' nem a 'Quónisbeaurgue' de que falava.

Era um bom profissional, e os utentes gostavam dele. Tinha sempre um sorriso - "é o meu carimbo", gostava de dizer - para oferecer com um papel. Não se lhe conheciam romances. Constava que a sua vida era mesmo aquilo que parecia: o de ajudar a manter a paz no rebanho, a felicidade de todas as ovelhas, perdoando as ovelhas negras, evitando que os jovens borregos seguissem por maus caminhos. Era uma alma em paz, ou uma paz de alma.

Mas tudo mudaria aquando dos ataques dos lobos. Em raides sucessivos, predavam sobre o rebanho. O pânico instalou-se, a vida quotidiana mudou. Tudo agora parecia um interlúdio até ao próximo ataque, de que ninguém saberia o momento. As ovelhas passaram a ser consumidas pelo medo omnipresente, e a tensão envenenou o dia-a-dia.

Os anos passavam agora mais pela cara de todos, pela do sr. Cordeiro também. Apesar de tudo, ia tentando fazer a sua vida nos mesmos exactos moldes, tentando ser agradável - não prescindindo dos seus sorrisos. Essa simpatia e placidez, no entanto, capturava agora em si a ansiedade dos seus colegas. "Como pode ele estar com aquela cara da forma que as coisas estão?", diziam. E por isso, tão somente, o sr. Cordeiro passou a sofrer discriminação e assédio por parte dos seus colegas.

"O que é que queres, meu filho? Estás à mão de semear...", disse-lhe um dia seu tio, o dr. Carneiro. Mas o sr. Cordeiro recusava a acomodar-se, seguir o mesmo estado de pânico dos colegas. Fazia até maior ênfase em partilhar o seu amor pela vida, e insistia no mesmo hábito de não criar inimigos. "Mas olha que uma ovelha sem inimigos, é como se não existisse..." avisá-lo-ia seu tio.

No turbilhão de emoções, e do desespero convertido em pequena agressão, o sr. Cordeiro lembrou-se de uma história muito antiga, que lhe contara o seu bisavô, um ovino da velha guarda, sério e vetusto, que tivera a fortuna de conhecer enquanto borrego.

Recordava-se desse avô lhe confiar um segredo bem guardado na família. Dizia ele que os Cordeiros provinham de uma linhagem muito antiga, e que inclusive tinham sangue caprino muito distante. Não, porém, um sangue caprino qualquer, mas de um caprino famoso, que a História consagraria como "Bode Expiatório".

Pensou se seria essa herança genética a lançar sobre si a fácil pequena agressão. Afinal, os destinos não mudavam com os tempos. Às vezes sonhava que estava a ser julgado no tribunal do rebanho, em que alguém dizia: "Meretíssimo: este ovino que tendes perante vós é o culpado da nossa desgraça". "Mas como, sr. advogado, se ele não é nenhum lobo?", replicava o juíz. "Pois bem, meretíssimo - mas também não é nenhum cão de guarda. Ninguém pode ter uma aparência tão tranquila e plácida perante os acontecimentos correntes, se não for ele mesmo parte do problema!". "Agarrem-no! Agarrem-no!", gritavam então as ovelhas exaltadas na sala de audiência. "Ordem no tribunal! Ordem no tribunal!", exigia o juíz martelando sobre a mesa.

O sr. Cordeiro acordava então, sobressaltado, a lã suada. Fitava o céu do curral alumiado pela parca luz do luar, recuperava os nervos, e tentava dormir novamente, contando seres humanos.

Momentos 14

Levantando as mãos em direcção à luz fluorescente do seu laboratório, o Dr. Sobral deu uma gargalhada. Ninguém o ouviria, àquela hora da noite. Ninguém distinguiria a luz quase de loucura nos seus olhos. Tinha conseguido, tinha resolvido o parodoxo - enfim. Reviu as equações de novo, e ainda outra vez. Riu-se ainda mais intensamente. Nunca se sentira tão eufórico - e estava sozinho, sem vivalma para se espantar com aquele furor. Mas estava certo - sabia-o. Conseguira deduzir o algoritmo final. A História estava a ser feita: doravante todos aqueles que o desejassem poderiam ter sol na sua eira, e chuva no seu nabal. E o Dr. Sobral - depois de uma disputa com um colega polaco, que terminaria nos tribunais - foi justamente glorificado como o descobridor da pedra filosofal da Agricultura.

Momentos 13

O menino Fábio de outrora era já um homem. Já não ia aturar mais as ordens, e os caprichos de seus pais. Já não ia tolerar mais qualquer intromissão no seu destino. Não - aquilo acabava ali e agora. E por isso decidiu explorar o lado negro, experimentar o proibido, conhecer o sabor do limite. Olhou para o relógio da cozinha: eram quase 19h. Esperaria ainda mais algum tempo. Mas então chegaria a hora, do tudo ou nada. Olhava para as laranjas na fruteira diante de si, repassando a promessa a si próprio. Não as comeria de manhã, nem à tarde, como tantas vezes repetiam os seus pais - mas à noite. Seria homem o suficiente para o cumprir. O Fábio obediente, respeitador, polido e empático morria ali. O futuro diria em breve se algum outro Fábio viveria.

À Noite

À noite
Bebem-se oportunidades
Passa-se ombros por saudades
Que ainda o não são.

Vaidades, hesitação
Instintos amordaçados
Por fados,
Etrelaçados
No dia de onde querem fugir.

À noite,
À noite há que sair
De nós mesmos,
Dos nós mesmos
Que nos prendem,
E falar
Porque quem cala consente.

À noite,
Deixamos um pouco da vida
Como chegámos a conhecer,
Antes desta brisa fria
Antes de a poder esquecer.

À noite,
Passam amores e esperanças
Por braços, fulgores, andanças
Passa uma solução.

À noite, se tiveres coragem
Encontras o teu coração.

Pedro Oliveira