terça-feira, julho 10, 2007

Pecado Original 14







Sophie Marceau. Inesquecível em Braveheart, contraponto feminino perfeito à nobreza masculina de Wallace/Gibson. E volto novamente ao que dizia Ferreira Fernandes sobre as parisienses aos 40.

Da Causa

Tenho por regra desconfiar sempre de quem se dedica a uma causa, qualquer que seja. Sempre achei que por detrás dessa dedicaçao, ou está um grande amor e idealismo (por vezes espírito religioso), ou, maior parte das vezes, uma espécie de redençao à sociedade, ao colectivo. Sao necessários à sociedade, é certo, mas penso duas vezes antes de aceitar a sua superioridade moral. Nao me refiro a voluntariado comum e anónimo, esse sim virtuoso, mas antes às causas mediáticas, aos arautos de partidos, movimentos ecologistas, clubes de futebol, mesmo do país.

segunda-feira, julho 09, 2007

Lisboa Cidade Mistério


Ainda a propósito do "Sentimento de um Ocidental", o poema de David Mourao- Ferreira, tao simples quanto belo, sobre as varinas desta cidade que nos captura (e falta-me ler ainda o que dela escreveu José Cardoso Pires, que também se rendeu aos seus encantos), com a sua luz centrípta e às vezes, estupidamente, parece ser o centro - o centro do mundo.

Maria Lisboa

É varina, usa chinela,
tem movimentos de gata;
na canastra, a caravela,
no coração, a fragata.

Em vez de corvos no chaile,
gaivotas vêm pousar.
Quando o vento a leva ao baile,
baila no baile com o mar.

É de conchas o vestido,
tem algas na cabeleira,
e nas velas o latido
do motor duma traineira.

Vende sonho e maresia,
tempestades apregoa.
Seu nome próprio: Maria;
seu apelido: Lisboa.

Adenda

Cesário: brilhante, mas mundano. Nao sao dele as epopeias e os impérios, somente os cantos da casa - e da vida.

Contrariedades

Eu hoje estou cruel, frenético, exigente;
Nem posso tolerar os livros mais bizarros.
Incrível! Já fumei três maços de cigarros
Consecutivamente.

Dói-me a cabeça. Abafo uns desesperos mudos:
Tanta depravação nos usos, nos costumes!
Amo, insensatamente, os ácidos, os gumes
E os ângulos agudos.

Sentei-me à secretária. Ali defronte mora
Uma infeliz, sem peito, os dois pulmões doentes;
Sofre de faltas de ar, morreram-lhe os parentes
E engoma para fora.

Pobre esqueleto branco entre as nevadas roupas!
Tão lívida! O doutor deixou-a. Mortifica.
Lidando sempre! E deve conta à botica!
Mal ganha para sopas...

O obstáculo estimula, torna-nos perversos;
Agora sinto-me eu cheio de raivas frias,
Por causa dum jornal me rejeitar, há dias,
Um folhetim de versos.

Que mau humor! Rasguei uma epopeia morta
No fundo da gaveta. O que produz o estudo?
Mais uma redacção, das que elogiam tudo,
Me tem fechado a porta.

A crítica segundo o método de Taine
Ignoram-na. Juntei numa fogueira imensa
Muitíssimos papéis inéditos. A Imprensa
Vale um desdém solene.

Com raras excepções, merece-me o epigrama.
Deu meia-noite; e a paz pela calçada abaixo,
Um sol-e-dó. Chuvisca. O populacho
Diverte-se na lama.

Eu nunca dediquei poemas às fortunas,
Mas sim, por deferência, a amigos ou a artistas.
Independente! Só por isso os jornalistas
Me negam as colunas.

Receiam que o assinante ingénuo os abandone,
Se forem publicar tais coisas, tais autores.
Arte? Não lhes convém, visto que os seus leitores
Deliram por Zaccone.

Um prosador qualquer desfruta fama honrosa,
Obtém dinheiro, arranja a sua coterie;
E a mim, não há questão que mais me contrarie
Do que escrever em prosa.

A adulação repugna aos sentimento finos;
Eu raramente falo aos nossos literatos,
E apuro-me em lançar originais e exactos,
Os meus alexandrinos...

E a tísica? Fechada, e com o ferro aceso!
Ignora que a asfixia a combustão das brasas,
Não foge do estendal que lhe humedece as casas,
E fina-se ao desprezo!

Mantém-se a chá e pão! Antes entrar na cova.
Esvai-se; e todavia, à tarde, fracamente,
Oiço-a cantarolar uma canção plangente
Duma opereta nova!

Perfeitamente. Vou findar sem azedume.
Quem sabe se depois, eu rico e noutros climas,
Conseguirei reler essas antigas rimas,
Impressas em volume?

Nas letras eu conheço um campo de manobras;
Emprega-se a réclame, a intriga, o anúncio, a blague,
E esta poesia pede um editor que pague
Todas as minhas obras...

E estou melhor; passou-me a cólera. E a vizinha?
A pobre engomadeira ir-se-á deitar sem ceia?
Vejo-lhe a luz no quarto. Inda trabalha. É feia...
Que mundo! Coitadinha!

O Eterno Duelo, a Minha Escolha

Que escolher: a perfeiçao de Pessoa ou a hombridade de Camoes? Pessoa é vários e nao é nenhum, um perfeito fingidor, mas há sempre aquele que somos em Pessoa. Camoes pode reclamar a suprema nobreza de ter cantado aquilo que viveu, de ter feito forma de poesia os seus sentimentos, genuínos. Talvez preferir Pessoa quando somos jovens e Camoes na idade adulta, pode ser uma soluçao. Ou entao, minha sugestao, ficarmos por Cesário, pela sua poesia melancólica, olfactiva - lisboeta.

Para mim, é um poeta de uma honestidade muito singela e tocante, com a capacidade de apreensao sensorial quase como a de uma criança. Vagueia num deslumbramento pacífico pela vida, sentindo cada pormenor. E, depois, desde a primeira vez que o li, entendi e nao pude senao admirar as referências que faz na sua poesia ao próprio acto de a escrever. Nao há maior honestidade que essa.


O Sentimento de um Ocidental


Avé-Marias

Nas nossas ruas, ao anoitecer,

Há tal soturnidade, há tal melancolia,

Que as sombras, o bulício, o Tejo, a maresia

Despertam-me um desejo absurdo de sofrer.

O céu parece baixo e de neblina,

O gás extravasado enjoa-me, perturba-me;

E os edifícios, com as chaminés, e a turba

Toldam-se duma cor monótona e londrina.

Batem os carros de aluguer, ao fundo,

Levando à via-férrea os que se vão. Felizes!

Ocorrem-me em revista, exposições, países:

Madrid, Paris, Berlim, Sampetersburgo, o mundo!

Semelham-se a gaiolas, com viveiros,

As edificações somente emadeiradas:

Como morcegos, ao cair das badaladas,

Saltam de viga em viga, os mestres carpinteiros.

Voltam os calafates, aos magotes,

De jaquetão ao ombro, enfarruscados, secos,

Embrenho-me a cismar, por boqueirões, por becos,

Ou erro pelos cais a que se atracam botes.

E evoco, então, as crónicas navais:

Mouros, baixéis, heróis, tudo ressuscitado

Luta Camões no Sul, salvando um livro a nado!

Singram soberbas naus que eu não verei jamais!

E o fim da tarde inspira-me; e incomoda!

De um couraçado inglês vogam os escaleres;

E em terra num tinido de louças e talheres

Flamejam, ao jantar, alguns hotéis da moda.

Num trem de praça arengam dois dentistas;

Um trôpego arlequim braceja numas andas;

Os querubins do lar flutuam nas varandas;

Às portas, em cabelo, enfadam-se os lojistas!

Vazam-se os arsenais e as oficinas;

Reluz, viscoso, o rio, apressam-se as obreiras;

E num cardume negro, hercúleas, galhofeiras,

Correndo com firmeza, assomam as varinas.

Vêm sacudindo as ancas opulentas!

Seus troncos varonis recordam-me pilastras;

E algumas, à cabeça, embalam nas canastras

Os filhos que depois naufragam nas tormentas.

Descalças! Nas descargas de carvão,

Desde manhã à noite, a bordo das fragatas;

E apinham-se num bairro aonde miam gatas,

E o peixe podre gera os focos de infecção!

Dinheiro Sujo

Na última Sábado, entrevista a Telmo Correia:

"Conhece o benemérito do CDS, um financiador com o estranho nome de Jacinto Leite Capelo Rego?

Nao conheço. (...) Aparentemente trata-se de uma brincadeira de mau gosto."

Flashback para os tempos de CMB em que o Chico usava o nome como parte do registo humorístico.

Só mesmo um partido como o CDS, liderado por um personagem como Portas, para ter patrocinadores com um sentido de humor tao... especial.

Sabedoria Brasileira

Ditados de um executivo brasileiro para o mundo do trabalho:

"Para ter sorte é preciso acordar cedo"

"Quem nao muda vira poste"

"Jacaré distraído vira mala de madame"