Posso ter uma visao enviesada por alguns anos de Lisboa. Mas quase me arriscaria dizer que os portugueses sao algo bipolares na sua sociabilidade. Quer dizer, o país só existe em sociedade, e somos um povo que beija, perdoa e experimenta, quando mobilizado. Na verdade, repare-se que nós nao temos catedrais excelsas, nem pintura por aí além, e poucas contribuiçoes científicas para a Humanidade. À excepçao da poesia e literatura, seríamos mesmo muito pequenos. O que realmente fazemos bem, quando nos superamos, é uma sociedade com uma certa beleza humana, que podemos dizer insuperável, e conseguimos atingir alguns feitos impossíveis para outros povos. Para nenhum povo é tao verdadeira a frase de que, se nós formos em direcçao ao impossível, ele recua.
No entanto, como contraponto a essa perfeita sociabilidade, existe a solidao, às vezes absoluta, nos centros urbanos, na velhice, nos hospitais. Um português só é uma coisa muito triste. A solidao é algo que vejo também instalar-se na juventude. A vida vem ter a casa, já nao a temos de procurar tanto quanto antes. Há telemóvel, TV, net, MSN, Hi5. As pessoas perdem alguma naturalidade e sinceridade na relaçao com os outros, condicionados por limites que intuem existir. Vejo muitos jovens estanques. Estou à vontade para o dizer - sempre gostei do meu isolamento. Mas eu conheço-o à muito tempo, e pratico-o para arrumaçao mental. Giro-o, nao lhe pertenço.
Mas Portugal tem tido, nos seus "casos isolados", fora do nosso poderoso e envolvente "mainstream", destaques nacionais. Poetas, escritores, intelectuais, profetas de toda a sorte. Por exemplo, para mim Álvaro Cunhal é um exemplo recente - foi um homem que se isolou dos outros para o que ele julgava ser o bem dos outros. O "caso isolado" português merece, do ponto de vista intelectual, muito respeito.
Mas acho que o isolamento juvenil urbano nao faz sentido. Se um jovem nao se apercebe desse perigo, passa a olhar-se somente a si. A preocupar-se demasiado com os seus sonhos, e como os outros nao lhos permitem. Perdem-se no seu narcismo, intelectual e físico. Bastam-se. Acreditem, meus caros, vale mais a pena tentar, errar, e começar de novo. Lembrem-se do que aconteceu ao maior narcisista da nossa história.