E pronto. O Chelsea de Mourinho foi novamente eliminado pelo Liverpool. É certo que por penalties, e nao menos certo que o Liverpool está concentrado nesta competiçao. Mas seria preciso mais como justificaçao.
Pessoalmente, congratulo-me com a eliminaçao do Chelsea. Comecemos talvez por esquecer uma certa "solidariedade lusitana" para com Mourinho. Ele próprio nao a tem quando vem jogar com um clube português (nem sequer poupou uma linha na sua cartilha 'mindgame' quando jogou com o Porto), e pelos vistos nao a tem também nas recentes polémicas com Ronaldo. Para quem esteja desactualizado, Mourinho respondeu às acusaçoes de mentiroso de Ronaldo rementendo para "uma infância difícil, sem educação apropriada". Bonito.
Esquecido esse "lip service" a Mourinho (o que, reconheço, é difícil, porque, adeptos de futebol e portugueses, há sempre um orgulho residual), avancemos. Deparamo-nos entao com um técnico excêntrico (está na pátria dos excêntricos, nada a assinalar) e uma equipa com uma abordagem ao futebol que nao posso senao classificar de tecnocrata. Vejamos: está ali uma aplicaçao científica do futebol: teoria psicológica avançada (Mourinho chama pressao para a evitar sobre os jogadores), esquemas tácticos elaboradíssimos (diz quem sabe), espionagem ao adversário, licenciaturas, mestrados, carga física programada, velocidade, pressao alta, 2-3-toques-bola-na-área, músculo, trabalho de equipa, dinheiro, organizaçao, calendarizaçao, ajuntos de adjuntos de adjuntos, directores de directores de directores. Tanta ciência, tanto state-of-the-art para cair ali em Anfield.
É que nao tem qualquer mal cair ali em Anfield. Isso é normal. Ridículo é pensar que se pode cientificar totalmente o futebol. Ainda bem que nao. Ainda bem que há um limite de incerteza, cada vez maior pelo equilíbrio das equipas, pela carga de jogos, pela harmonizaçao das variáveis.
Nao me venham dizer que o futebol é uma questao só de trabalho, como insinua Mourinho. Ou de talento do treinador, como ele também pode supor. Continua a ter algo de extraordinário e irracional - e do domínio somente dos jogadores e das variáveis extrínsecas. Por exemplo, quem tenha visto os penalties facilmente descortina uma capacidade técnica superior na execuçao dos jogadores do Liverpool. Os jogadores do Chelsea pareciam-me todos iguais, a bola lançada para o mesmo lado, à mesma altura, com a mesma força. Tristes soldados, homens feitos a dar pontapés, nem um átomo do sonho de criança: ser jogador de bola (à excepçao talvez de Lampard e Robben).
A verdade é que sempre achei que muito da galáxia Mourinho era só palha para a manjedoura dos comentadores do jogo. Em especial os da televisao, que puderam deixar de dizer só "Néné passa para Niquinha" e "4 minutos de compensaçao", para entrarem em consideraçoes sobre a "pressao alta", e "o célebre losango do meio-campo". Para aqueles que, como eu, esqueceram grande parte da sua Geometria Euclidiana, soa a banha-da-cobra.
Nao venho dizer tudo isto porque Mourinho perdeu. Já o havia dito antes, diria igualmente se tivesse ido à final, acreditem. Eu pelo-me por um bota-abaixozinho sempre que vejo pirâmides de Quéops no futebol. Já provei o doce sabor de estar certo com o Real Madrid, espero ainda pela confirmaçao no Chelsea.
Às vezes, gostemos ou nao, é tudo uma questao de sorte. Essa grande justiceira.