segunda-feira, novembro 12, 2007

Mundo Lusófono

Se se diz "eu não sou racista, mas...", há sempre o "mas" em que os demais pegam como negação da primeira parte da frase. Mas se se o omite, é-se igualmente estranhado - porque dizê-lo é litúrgico e, como povo semi-católico, o português até pode pecar, só não deve falhar na liturgia.

Vou-me, assim, esquivar ao "saying" o "goes without saying" que precisa de ser dito. Confusos? Calma. Serve a introdução do elemento catártico, mais que o elemento em si, para pegar no poema "Lágrima de Preta" de António Gedeão. Somente para atentar na coincidência de o ter colocado no blog ontem, e hoje, verdadeiramente me ter espantado com a quantidade de pessoas de cor negra na minha faculdade.

Ok, volto atrás. Nada tenho contra os negros - cedo à necessidade de o dizer. De todo. Sou muito mais racista com a estupidez, mediocridade e bovinidade - a falta absoluta de algo especial na vida - do que com qualquer raça.

Mas insisto - fiquei abismado com a quantidade de pessoal (soa melhor assim?) "de cor" a entrar hoje na minha universidade. A Lusófona (pois assim se conhece) tem imensa gente - gente a mais, para o meu prazer de serenidade. E bastantes protocolos (pífios?) de acolhimento a estudantes africanos. Daí a inusitada quantidade. Sejamos francos, senhores, - muito mais que a densidade portuguesa média.

A questão aqui está no facto de, exactamente, não serem portugueses. Os negros portugueses são... exactamente como os outros portugueses. Um dos meus projectos é ter um amigo negro com quem possa falar livremente da sua cor, que isso seja tão natural como da minha barriga. Da mesma forma que pretendo ter várias amigas atraentes e falar livremente com elas sobre os seus atributos físicos... (talvez esse projecto seja mais apelativo - e mais difícil). Chama-se "à vontade". Sinto que tenho alguma legitimidade para o fazer - amiúde sou o meu maior crítico jocoso.

Mas, de facto, os africanos levam o continente nos olhos. É algo de distinto. São luso-africanos, e isso faz também a diferença, nota-se. Pacíficos, educados, mas... surpresos, espantados, olhando olhos europeus com uma notória curiosidade. Aconteceu-me hoje, ao distribuir folhetos à entrada da Lusófona para recolha de medicamentos fora de prazo (a propósito, se os tiverem, a recolha dura a semana inteira). Parece que aquele fugaz contacto é inesperado, prazer de curiosidade, mais importante que o saco dentro do folheto para colocar os medicamentos, mais importante que a viagem ao Brasil em sorteio (e daí talvez não). Pelo menos, eu achei. "Eh pah... este gajo nunca falaria comigo se não fosse para me dar isto", pensarão. Conheço de cor o sentimento - o mesmíssimo que eu teria a falar com uma rapariga gira a querer-me vender algo. Subitamente tratamos com alguém "acima" do nosso nível (eu não disse que estava acima!, digo somente que eles o pensarão).

Enfim, acho curioso. Vestem mais ou menos da mesma forma humilde, e são humildes também a ouvir (e eu sou sempre a favor dos humildes). O facto inusitado, perdoem-me a honestidade, foi mesmo a... quantidade imensa.

Mas os africanos são, no geral, boa onda - há fauna menos confortável ao nosso lado. Tenho visto também pela universidade umas figuras proto-brasileiras (chungas de má vida e uma mulher mulata de cara horrível, brutissima) que parecem directamente saídos da "Cidade de Deus". Aliás, não faltarão à Lusófona membros do "bas-fond" - sim esses em que estão a pensar. Os tais, as tais - a malta do transgredire. Nem quero pensar muito nisso. Mas enfim, que a coisa aos meus olhos tantas vezes parece clara, só pela pinta, - parece.


Por entre gente normal (baixa classe média, e média-média - o meu curso é algo de excepção), e bastante boa gente, vejo às vezes membros de outros lugares andando livremente. Por entre os estudantes que se arrastam falando, além do remanso dos cafés onde o fumo torna o ambiente irrespirável, vejo - poucos, apesar de tudo - personagens que não deviam estar a roçar ombros com gente inocente. Mas deve ser só da minha vista. Embora eu tenha a maldição de, por análise a posteriori tantas vezes confirmar a minha primeira impressão, visceral e apriorística.